09/04/2020
Já está sendo colocada em prática a Recomendação nº 63, do Conselho Nacional de Justiça, criada com o intuito de nortear os Juízos nos processos de recuperação judicial, mitigando os impactos causados pela pandemia.
A medida orienta que as decisões judiciais tenham como escopo principal a manutenção da atividade empresarial, exatamente na linha do que estabelece o artigo 47 da Lei 11.101/2005, e indica uma série de medidas que podem ser adotadas nos aludidos processos.
Estas são, em síntese, as recomendações:
1) Prioridade na análise e decisão sobre questões relativas ao levantamento de valores em favor de credores ou empresas em recuperação;
2) Suspensão das Assembleias Gerais de Credores presenciais, podendo ser realizadas por meio virtual, em caso de urgência, para a manutenção das atividades empresariais da devedora e para o início dos pagamentos aos credores;
3) Prorrogação do período de suspensão das ações e execuções contra a empresa em recuperação (stay period), quando houver a necessidade de adiar a realização da Assembleia Geral de Credores;
4) Autorização de apresentação de plano modificativo de recuperação judicial, quando já estiver em fase de cumprimento, desde que comprovada a diminuição na capacidade de adimplemento das obrigações em decorrência da pandemia, devendo ser incluída a consideração de ocorrência de força maior ou caso fortuito;
5) Determinação aos administradores judiciais para que sigam fiscalizando as atividades da empresa em recuperação de forma remota ou virtual;
6) Avaliação, com cautela, sobre o deferimento de medidas de urgência, decretação de despejo e realização de atos executivos de natureza patrimonial em ações judiciais que demandem obrigações inadimplidas durante o estado de calamidade pública.
Na linha da Recomendação nº 63, no último dia 6 de abril, o Juízo da 8ª Vara Cível de São Bernardo do Campo (SP) deferiu, nos autos da Recuperação Judicial nº 1024091-12.2014.8.26.0564, o pedido de suspensão do pagamento de todos os créditos – e não somente os inscritos nas Classes III e IV, objeto do pleito da empresa em recuperação – até o dia 10 de julho de 2020.
Conforme asseverado na aludida decisão, “é evidente a ocorrência de força maior (pandemia COVID-19), que exige relativização episódica do plano de recuperação judicial, para viabilizar a superação da crise econômica-financeira decorrente da COVID-19, mantendo-se, a um só tempo, a fonte produtora, os emprego de trabalhadores e os interesse de credores”.
Foi ressaltada, por meio da decisão, a preservação da empresa e de sua função social, bem como o estímulo à atividade econômica e reequilíbrio da relação obrigacional constituída no plano de recuperação judicial.
Embora não seja dotada de efeito vinculante ao Poder Judiciário, a Recomendação é importante instrumento norteador e que busca, de alguma maneira, uniformizar o tratamento da matéria.
Com o intuito de acomodar tamanho impacto econômico e dada a relevância do tema, em 2 de abril foi apresentado à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 1.397/2020 que propõe, dentre outras, (i) a suspensão, por 60 (sessenta) dias, das ações e execuções que envolvam discussões ou cumprimento de obrigações vencidas após 20/03/2020 e revisões de contratos, (ii) a negociação preventiva após o período de suspensão legal e (iii) plano especial para as microempresas e empresas de pequeno porte e (iv) alterações provisórias na Lei de Recuperação Judicial e Falências, como a suspensão do direito de o credor cobrar os garantidores.
O projeto ainda está na fase inicial de tramitação, aguardando despacho do Presidente da Câmara dos Deputados. Sem prejuízo do trâmite do Projeto de Lei, é a Recomendação nº 63, do CNJ, quem deverá balizar as decisões judiciais nos processos de Recuperação Judicial e Falência durante a crise provocada pela pandemia.
Flávia Tiezzi Cotini de Azevedo Sodré